segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Eléctricos batem recorde em 2010

 
É o maior aumento desde 2007, quando abriu a terceira rota no Porto, na Linha 22. No ano passado, os carros eléctricos transportaram 390 mil pessoas, 32 mil por mês, mais de mil por dia. O perfil de clientes mantém-se: a imensa maioria é constituída por turistas.
Alfredo Reis, 73 anos, reformado de penteado grisalho, é o único dos 11 passageiros ali dentro que não olha de máquina fotográfica na mão. Foi pelo hábito que deixou de se pasmar.
"Sabe, a gente habitua-se a tudo, até à beleza mais extrema. E quem anda aqui todos os dias olha sempre, mas sabe como é, parece que já nem vê", diz ele, vai sentado, olha seguidamente pela janela, afia o olhar e, agora sim, põe-se a reparar. "É. Não conheço nada igual. É muito lindo. São vistas de postal".
É um carro eléctrico do Serviço de Transportes Colectivos do Porto, Linha 1, larga do largo da Rua de S. Francisco, abaixo da grande igreja de pedra dourada, à frente o rio é só água a brilhar, uma encosta de casas em cascata, barcos negros como corvos a deslizar, viaja-se de frente para o sol, e tem razão Alfredo, o gris, estar ali é estar dentro de um postal.
É um dia de semana e Alfredo Reis é o único português que entra no eléctrico da tarde. Havia mais: cinco italianos, em alto e permanente fragor, dois espanhóis, baixinhos e jocosos, um casal adolescente, loiro, a falar e a afagar francês, e um belga sozinho com ar de quem vai a sonhar.
Não é só a paisagem que pasma; ir de eléctrico é também irreal. A máquina é de 1930, zumbe, treme nas 12 toneladas, avança aos supetões, parece um grande escafandro com janelas que emergiu do mar e anda na estrada a rabear. Mas é uma relíquia de requinte, é quase um luxo, belos bancos de couro e ferro, a polida madeira talhada, todo o vagão a ronronar.
O passageiro português, que vai sair na Cantareira, é a percentagem certa de viajantes locais, confirma o guarda-freio José Brandão, 47 anos, agarrado às alavancas da frente, a carrear aquela máquina. "É um número a olho, mas os turistas, aqui, são para aí 90%. Compreende-se: é uma bela viagem. E compensa: 1,5 euros de bilhete, 1 euro para quem tiver o Andante. Mas vai muito devagar, não dá para quem vai trabalhar".
Com turistas e nacionais, as três linhas de eléctrico que hoje operam no Porto estão há quatro anos em fluxo crescente de passageiros, desde que foi retomada a Linha 22 (Carmo/Batalha), aquela em que a procura mais aumentou: 33%, 132 mil validações num ano. Globalmente, as três linhas tiveram o maior registo de sempre: 390 mil pessoas só num ano.
"São números que têm vindo sempre a subir", confirma Helena Branco, assessora da STCP. "É de prever que no curso deste ano continue a aumentar a procura e se bata mesmo um novo recorde".
A Linha 1, com Alfredo e os excursionistas, vai até à Foz, sempre a beirar o rio, até ao rio se alistar no mar. Sai do Infante, segue Miragaia, o casario colorido, curva no Cais das Pedras, estrela o sol, a água a coalhar, o vagão avança e vibra. Acelera em Massarelos, vê-se o arco branco e grande da Arrábida, passa a ponte, Rua do Ouro afora, desliza num doce zunido, é quentinho o vagão.
Cais do Ouro, pescadores a desenredar, acelera, vira a curva do Mirante, há um anjo, a Afurada, voam garças, patos e parapentes. Continua, vai a tinir, vai a zoar, Cantareira, cascos coloridos, avista-se o farol, arriba ao Passeio Alegre, há palmeiras, contraluz, e pára à porta da casa onde já não está Eugénio de Andrade.

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