sexta-feira, 27 de agosto de 2010

Há 140 anos os "americanos" revolucionaram a vida no Porto


Foi há 140 anos e dois dias que um decreto publicado no Diário do Governo dava o tiro de partida para o estabelecimento da primeira linha de carros americanos - carruagens sobre carril puxadas a cavalo - do país. O percurso concessionado iniciava-se na Porta Nobre (Miragaia) e seguiria por Massarelos até à Foz e Matosinhos (vila integrada então no município de Bouças ). Trata-se da primeira concessão de transporte público no Porto, pelo que a Sociedade de Transportes Colectivos (STCP) considera esta data como a da sua fundação.

A inauguração oficial do "americano" apenas se deu quase dois anos depois - a 15 de Maio de 1972, com direito a música e foguetes -, pelo que a STCP vai prolongar as iniciativas alusivas a esse aniversário até 2012. "Iremos eleger factos marcantes desse período, mas também lançar novidades", anuncia Fernanda Meneses, presidente do conselho de administração da empresa.

O concessionário foi o Barão da Trovisqueira, um antigo emigrante no Brasil, que regressava endinheirado à terra natal, Vila Nova de Famalicão. As preocupações estabelecidas no decreto - que hoje poderia ser considerado como leonino, a favor do Estado - centravam-se na qualidade do material circulante e no cuidado que se deveria ter para "não danificar a estrada". Hoje em dia, as prioridades da administração da STCP são bem diferentes: racionalizar a frota, não poluir o ambiente e garantir o máximo de informação aos clientes.

"No decreto de 1870 não se fala sequer do cliente", explica Fernanda Meneses. O custo da viagem era de 120 reis desde a Rua dos Ingleses a Matosinhos, de 40 reis da Cordoaria (Mártires da Liberdade) a Massarelos e de 80 reis da Cordoaria à Senhora da Luz, na Foz. A partida dos carros era feita de meia em meia hora, desde as 6h00 até às 20h00 e o início da viagem era assinalado com um toque de corneta. O transporte de pessoas e mercadoria era feito em simultâneo.

Muitos descarrilamentos

Fernanda Meneses lembra a agitação política que Portugal viveu na década de 1870 como uma das dificuldades que tiveram de ser ultrapassadas para o estabelecimento do serviço. Para além disso, "a Câmara Municipal colocou vários obstáculos ao percurso das vias e os descarrilamentos eram frequentes". As primeiras viagens experimentais realizaram-se em Outubro de 1871 e o "americano" chegou à Foz - em serviço "transitório" - a 9 de Março de 1872. "Mesmo aquando da viagem inaugural ocorreram pequenos descarrilamentos", recorda a presidente da empresa.

De qualquer forma, o carro americano foi revolucionário e permitiu o alargamento da cidade e o crescimento acelerado de povoações vizinhas. A empresa concessionária era designada Companhia de Carril Americano do Porto à Foz e Matosinhos e, em 1873, surgiu também a Companhia Carris de Ferro do Porto (CCFP). Esta era a "companhia de cima", enquanto a mais antiga era conhecida pela população como a "companhia de baixo", porque estabelecia as ligações entre o centro da cidade e outros lugares à cota baixa. As duas empresas fundiram-se nesse mesmo ano, permanecendo o nome da CCFP, que daria origem, em 1946, ao Serviço de Transportes Colectivos do Porto, liderado pela Câmara Municipal.

O Porto tem, aliás, uma tradição de modernidade no que ao transporte público diz respeito: em 12 de Setembro de 1895 era inaugurada a primeira linha de carros eléctricos da Península Ibérica, entre o Carmo e Massarelos. "Isso traduz uma posição de dinamismo e inovação, que a empresa manteve ao longo dos tempos e que tentamos respeitar e honrar", sublinha Fernanda Meneses.

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